sábado, 18 de maio de 2013

Os caminhos do Tambor

"Bliss é aquela sensação profunda de estar presente, de fazer o que você decididamente deve fazer para ser você mesmo. Se você conseguir se ater a isso, já estará no limiar transcendente." Joseph Campbell

Este foi o início do meu caminho:

Há bastante tempo atrás quis ter um tambor.

Tentei ir à várias oficinas para faze-lo, mas sempre surgia um impedimento. Um bloqueio, meu...de pessoas ao meu redor e do Universo. Um dia me cansei e declarei, vou comprar um. Encontrei um fazedor de tambor tradicional, mestre...Marcelo Caiuã. Ele foi entendendo a minha busca, ficamos conversando por email...ele mora no sul do país e eu falando do meu tambor Arco Iris, lembrando da profecia do povo Hopi e da tribo do Arco Iris.
Meu tambor chegou numa caixa de papelão, quando eu abri tinha um envolucro preto, depois mais um embrulho, e outro e outro, até que ele pulou para fora exalando seu som. Nasceu. Foi pura magia.
Somos cercados de milagres, cada atitude é uma gota de orvalho trazendo nova vida ao nosso redor.

Hoje eu e ele dançamos, viajamos, vamos praticar na roda da Monica Jurado todas as semanas, e estou aprendendo tanto com esta parceria amorosa - eu/tambor. E o ritmo. O poder. Todas as dimensões alinhadas, passado/presente/futuro juntos, num instante só trazendo a consciência do caminhar da alma, dos resgates, das gerações. do Porvir.

Dançamos sozinhos, em outras rodas, visitamos pessoas e cavalgamos em liberdade e alegria pelos mundos, levando passo e compasso. 

O tambor é um instrumento feminino, por excelência. É a batida do coração, do corpo, o som primordial, o som do ventre que ouve o coração da mãe.


Tocar o tambor foi me trazendo o real sentido de estar presente, de ter práticas, disciplinas, entendimentos para realizar cada vez mais o meu trabalho e seguindo o ritmo, unindo todas as partes numa única linguagem.

Tudo tem e vem a seu tempo.
E assim fui assumindo a Mulher Selvagem e seu tambor simplesmente fazendo o que devia ser feito, unindo busca e qualidade na minha jornada.



Agora estou coordenando grupos de estudo do livro da Clarissa Pinkola Estés "Mulheres que correm com os Lobos" junto com as Oficinas Criativas (e com o tambor), fazendo as Oficinas de Filtro dos Sonhos. E montando mais Oficinas Criativas de Desenvolvimento Humano com mandalas, máscaras, argila, nanquim e muita diversão. Porque a vida é divertida, os aprendizados são divertidos. Ás vezes no início é bem dificil, mas depois quando olhamos para traz fica leve, divertido mesmo - quando somos capazes de compreender ...


Foram décadas para pegar um rumo e unir a espiritualidade à razão. O tambor me trouxe isso de presente.


Mitakuye Oyasin


Abaixo segue uma pequena pesquisa sobre outros caminhos dos tambores e sua cultura em outros lugares. A quem interessar:

Os nativos norte americanos associam o toque do tambor ao coração da Mãe Terra e também ao seu útero. O tambpr da acesso à força vital através do seu ritmo.
O tambor é considerado o cavalo ou a canoa, que leva ao mundo espiritual. É o instrumento que faz a conexão Céu e Terra.
É utilizado por sacerdotes do mundo inteiro. Como o Damaru (instrumento de Shiva), os tambores japoneses, as tumbadoras cubanas, cultos afro..




Entre os índios brasileiros existem os tambores de cerâmica (percutido com uma baqueta), o tambor d'água (de cerâmica cheio de água); o tambor de fenda, que é uma madeira cavada em um tronco com aberturas circulares (sem pele), pendurados há alguns centímetros do chão e tocados por duas baquetas, e os tradicionais tambores de pele.

A velocidade de toque para uma jornada xamânica varia de 150 a 200 batidas por minuto.Os sons repetitivos e monótonos, permitem ao xamã alterar sua consciência. O antropólogo M. Harner, relata uma pesquisa feita em laboratório, que o tambor produz modificações no sistema nervoso, pois as batidas são de baixa frequência, predominando o nível de frequência do eletroencéfalograma, por esse motivo, para conservação do transe, geralmente um assistente assume o tambor. O tambor associado a cânticos, sinos , e outros intrumentos cria um ambiente muito propício para o transe.
Alguns xamãs chegam a afirmar que o trabalho xamânico não acontece sem um tambor. O chefe do tambor, ogã, tamborileiro, é o maestro da viagem, do transe. Os toques podem aumentar o campo de força. Existem toques para cura, para guerra, para as jornadas.
Histórias nativas contam que o tambor é um presente enviado pela Águia. É o veículo do xamã, que nos permite comunicar na língua sagrada do espírito.
Um tambor xamânico é construído dentro dos parâmetros muito precisos para a eficácia máxima. A borda é feita da madeira, geralmente cedro, ou uma madeira local com bom resonate qualidades. A cobertura é mais tipicamente do couro cru .
O tambor xamânico produz estados claros de transe e níveis de relaxamento profundo. É também meio de conectar com os pontos mais distantes da grade energética. O tambor sagrado alinha-nos com as forças da harmonia. A harmonia é um atributo universal da consciência, e ajuda-nos viajar, através do espaço do coração. Quando nós ouvimos o tambor ressoar nós criamos uma possibilidade de oferecer a vida para nos e o universo inteiro.
O tambor nos leva a examinar o espírito, dá-nos uma voz do espírito e as orelhas do espírito. Alce Negro - Wallace Black Elk , xamã lakota disse : "quando você reza com o tambor , quando os espíritos ouvem esse tambor que ecoa, nossa voz superior é desobstruída".
(site do Léo Artese - www.xamanismo.com.br )

Na cultura celta temos o Bodhrán que era usado também como peneira de alimentos.
Bodhrán é um instrumento bastante peculiar na musica celta, no folk e em vários estilos e é de uso comum à Irlanda, Escócia e Pais de Gales, sua pronucia correta é (bow-rawn ou boran). É semelhante a um tambor onde o couro é esticado sobre um arco de madeira. Tradicionalmente o tronco de freixo, uma arvore de madeira dura e amarelada, muito comum na Europa é usada para a fabricação do arco e o revestimento é feito com pele curtida de cabra ou de cervos. Pode ser tocado com as mãos ou com o "cipin" uma haste de madeira de formatos diversos.









O Daff embora constantemente confundido com o Riq é também muito conhecido no mundo árabe.
No período pré Islamico no Egito este instrumento era utilizado somente por mulheres que ainda hoje utilizam o Daff para acompanhar as danças femininas e em particular nas festas citadinas. No médio oriente este instrumento é utilizado para acompanhar canticos religiosos. O Daff distingue-se do Riq pelo seu diametro (30cm) e a sua armação é mais alta.




                                               




       
 Os tambores são utilizados desde as mais remotas eras da humanidade. Acredita-se que os primeiros tambores fossem troncos ocos de árvores tocados com os pés ou galhos. Posteriormente, quando o homem aprendeu a caçar e as patas de animais passaram a ser utilizadas na fabricação roupas e outros objetos, percebeu-se que ao esticar um pé sobre o tronco, o som produzido era mais agudo. Pela simplicidade de construção e execução, tipos diferentes de tambores existem principalmente no Brasil. A variedade de formatos, tamanhos e elementos decorativos depende dos materiais encontrados em cada região e dizem muito sobre a cultura que os produziu.


Os tambores exerciam nas civilizações primitivas diversos papéis. Além da produção de música para rituais e festas, os tambores, devido à sua grande potência sonora, também foram usados como meios de comunicação.
Nos textos bíblicos é possível encontrar várias referências ao tambor. Entre muitas, de destacar, no antigo testamento, alguns exemplos: Após a passagem pelo mar VermelhoMiriam e as mulheres de Israel dançaram ao som de tamboris (Êxodo 15:20). Outras mulheres dançaram com tamboris após as vitórias de Saul e David (1 Samuel 18:6). O Salmo 149 (verso 3) incentiva a louvar ao Senhor com harpa e adufe. (fonte Wikipédia)


~~o barulho do coração fazendo ecoar pelos ares, fazendo-se presente e atuando. Evocando o Ser como ele é, ancorado por um propósito e conquistando seu espaço de direto.

Miranda Rondeau's - Dragonfly (Libelula)




Paz e beijo para vcs;

Patty

terça-feira, 7 de maio de 2013

A moça tecelã


          


"Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear.

Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.

Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.

Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.

Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.

Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias.

Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranquila.

Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado.

Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponto dos sapatos, quando bateram à porta.

Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.

Aquela noite, deitada no ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.

E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.

— Uma casa melhor é necessária — disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.

Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.
— Para que ter casa, se podemos ter palácio? — perguntou. Sem querer resposta imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates em prata.

Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.

Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.
— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!

Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo.

Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.



          Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins. Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.

A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura, acordou, e, espantado, olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.

Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte."

Fim



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Perfil:
Marina Colasanti (1938) nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei, mas não devia e também por Rota de Colisão.

Dentre outros, escreveu
E por falar em amor, Contos de amor rasgados, Aqui entre nós, Intimidade pública, Eu sozinha, Zooilógico, A morada do ser, A nova mulher, Mulher daqui pra frente, O leopardo é um animal delicado, Esse amor de todos nós, Gargantas abertas e os escritos para crianças Uma idéia toda azul e Doze reis e a moça do labirinto de vento.

Colabora, também, em revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. Casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant'Anna.