sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Caeiro e o Natal




    Num meio-dia de Primavera
    Tive um sonho como uma fotografia.
    Vi Jesus Cristo descer à terra.
    Veio pela encosta de um monte
    Tornado outra vez menino,
    A correr e a rolar-se pela erva
    E a arrancar flores para as deitar fora
    E a rir de modo a ouvir-se longe.

    Tinha fugido do céu.
    Era nosso demais para fingir
    De segunda pessoa da Trindade.
    No céu tudo era falso, tudo em desacordo
    Com flores e árvores e pedras.
    No céu tinha que estar sempre sério
    E de vez em quando de se tornar outra vez homem
    E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
    Com uma coroa toda à roda de espinhos
    E os pés espetados por um prego com cabeça,
    E até com um trapo à roda da cintura
    Como os pretos nas ilustrações.
    Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
    Como as outras crianças.
    O seu pai era duas pessoas -
    Um velho chamado José, que era carpinteiro,
    E que não era pai dele;
    E o outro pai era uma pomba estúpida,
    A única pomba feia do mundo
    Porque nem era do mundo nem era pomba.
    E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
    Não era mulher: era uma mala
    Em que ele tinha vindo do céu.
    E queriam que ele, que só nascera da mãe,
    E que nunca tivera pai para amar com respeito,
    Pregasse a bondade e a justiça!


    Um dia que Deus estava a dormir
    E o Espirito Santo andava a voar,
    Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
    Com o primeiro fez com que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
    Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
    Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
    E deixou-o pregado na cruz que há no céu
    E serve de modelo às outras.
    Depois fugiu para o sol
    E desceu no primeiro raio que apanhou.
    Hoje vive na minha aldeia comigo.
    É uma criança bonita de riso e natural.
    Limpa o nariz ao braço direito,
    Chapinha nas poças de água,
    Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
    Atira pedras aos burros,
    Rouba a fruta dos pomares
    E foge a chorar e a gritar dos cães.
    E, porque sabe que elas não gostam
    E porque toda a gente acha graça,
    Corre atrás das raparigas
    Que vão em ranchos pelas estradas
    Com as bilhas às cabeças
    E levanta-lhes as saias.


    A mim ensinou-me tudo.
    Ensinou-me a olhar para as coisas.
    Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
    Mostra-me como as pedras são engraçadas
    Quando agente as tem na mão
    E olha devagar para elas.


    Diz-me muito mal de Deus.
    Diz que ele é um velho estúpido e doente,
    Sempre a escarrar para o chão
    E a dizer indecências.
    A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
    E o Espirito Santo coça-se com o bico
    E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
    Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
    Diz-me que Deus não percebe nada
    Das coisas que criou -
    "Se é que ele as criou, do que duvido." -
    "Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
    Mas os seres não cantam nada.
    Se cantassem seriam cantores.
    Os seres existem e mais nada,
    E por isso se chamam seres."

    E depois, cansado de dizer mal de Deus,
    O Menino Jesus adormece nos meus braços
    E eu levo-o ao colo para casa.

    ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

    Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
    Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
    Ele é humano que é natural.
    Ele é o divino que sorri e que brinca.
    E por isso é que eu sei com toda a certeza
    Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

    E a criança tão humana que é divina
    É a minha quotidiana vida de poeta,
    E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.
    E que o meu mínimo olhar
    Me enche de sensação,
    E o mais pequeno som, seja do que for,
    Parece falar comigo.


    A Criança Nova que habita onde vivo
    Dá-me uma mão a mim
    E outra a tudo que existe
    E assim vamos os três pelo caminho que houver,
    Saltando e cantando e rindo
    E gozando o nosso segredo comum
    Que é saber por toda a parte
    Que não há mistério no mundo
    E que tudo vale a pena.

    A Criança Eterna acompanha-me sempre.
    A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando.
    O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
    São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

    Damo-nos tão bem um com o outro
    Na companhia de tudo
    Que nunca pensamos um no outro,
    Mas vivemos juntos e dois
    Com um acordo íntimo
    Como a mão direita e a esquerda.

    Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
    No degrau da porta de casa,
    Graves como convém a um deus e a um poeta,
    E como se cada pedra
    Fosse todo o universo
    E fosse por isso um grande perigo para ela
    Deixá-la cair no chão.

    Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
    E ele sorri porque tudo é incrível.
    Ri dos reis e dos que não são reis,
    E tem pena de ouvir falar das guerras,
    E dos comércios, e dos navios
    Que ficam fumo no ar dos altos mares.
    Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
    Que uma flor tem ao florescer
    E que anda com a luz do Sol
    A variar os montes e os vales
    E a fazer doer aos olhos os muros caiados.

    Depois ele adormece e eu deito-o.
    Levo-o ao colo para dentro de casa
    E deito-o, despindo lentamente
    E como seguindo um ritual muito limpo
    E todo materno até ele estar nu.

    Ele dorme dentro da minha alma
    E às vezes acorda de noite
    E brinca com os meus sonhos.
    Vira uns de pernas para o ar,
    Põe uns em cima dos outros
    E bate palmas sozinho
    Sorrindo para o meu sono.
    ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

    Quando eu morrer, filhinho,
    Seja eu a criança, o mais pequeno.
    Pega-me tu ao colo
    E leva-me para dentro da tua casa.
    Despe o meu ser cansado e humano
    E deita-me na tua cama.
    E conta-me histórias, caso eu acorde,
    Para eu tornar a adormecer.
    E dá-me sonhos teus para eu brincar
    Até que nasça qualquer dia
    Que tu sabes qual é.

    ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

    Esta é a história do meu Menino Jesus.
    Por que razão que se perceba
    Não há-de ser ela mais verdadeira
    Que tudo quanto os filósofos pensam
    E tudo quanto as religiões ensinam ?

    Alberto Caeiro
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E como Natal é nascer, que a sementinha em nós seja a eterna criança a brilhar.
bj grande;

Patty

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Circulo de Gente!

Fui convidada para participar de uma roda  -  I Jornada rumo ao Feminino Sagrado organizada pelas escritoras do livro O Feminino e o Sagrado, Bia del Picchia e Cristina Balieiro e algumas convidadas que participaram das histórias do livro.
Primeiro veio a emoção de encontrar estas guerreiras relatadas no livro que com coragem contaram as suas experiencias nos mostrando a intensidade dos processos para permitirmos a expressão da nossa essencia. A peregrinação é dificil, mas somente assim fazemos o Caminho do Herói, mais uma vez e mais uma vez. Porque uma vez com as ferramentas obtidas (com muito esforço) continuamos a subir a cachoeira, a montanha pois sabemos o que está do outro lado - temos fé!
E com esta fé Cassia Simone nos contou um estória/História, no formato de fábula que nos remetia às duas escritoras. O circulo atento e, vagarosamente eu ia sendo remetida ao meu incosciente infantil e ao mesmo tempo às fogueiras onde as sacerdotizas contavam as historias para o seu grupo, limpando assim a mente e trazendo a atenção para a magia existente ali.
A roda era mista. Tinham homens, que tinham conhecimento, admiração e respeito por nós. E que tinham também o feminino inserido neles, com sabedoria e sensibilidade. Uma delicia isso.
Fecho os olhos e descubro depois que outras pessoas sentiram a presença da Corça - o simbolo da gentileza, da compreensão, da comunicação amorosa. E com este convite adentramos a floresta aos sons de tambores comandados pela Monica Jurado - tinha uma moça que cantava mantras indianos em devoção a Avalokitesvara - Kuan Yn...e todas as cores do arco iris vinham descendo junto com os totens a nos saudar em mais uma linda viagem à floresta das sensações, do inconsciente, dos desejos.
30 minutos que foram uma eternidade de beleza e harmonia. É assim quando nos encontramos para fazer o bem? O tempo para afim de observar o que acontece.
Depois desta emoção que nos levou ao silencio tivemos uma aula com a Mãe Solange, mulher sabida do mundo do Candomblé e cheia de alegria e simplicidade para nos ensinar um bocadinho desta mitologia. Mãezona feliz, grande mestra. Nos acordou da meditação anterior com as gargalhadas e como não poderia deixar de ser o ancoramento de todas as energias que foram evocadas.
Mulheres quando se encontram tomam chá, conversam  e se lembram de falar do cabelo, do espaço, do preço dos apartamentos, nada fica de fora, tudo é sagrado. TUDO O QUE MOVE É SAGRADO. E fazemos muito bem isso, sem proibições e regras, respeitando sempre o momento e as intuições. E assim voltamos para uma dança circular, conduzida pela Renata...meditação consciente e ativa...olho no olho, mão com mão. Estamos aqui/agora.
Monica Von Koss nos dirigiu para a Mitologia Oriental contando um bocado do seu novo livro que é uma pesquisa profunda do feminino nesta região. Interessante podermos enxergar o mundo na roda. A Africa, o Japão, a India, o Brasil, Europa, tava tudo ali.
Jerusha nos trouxe o Tai Chi com seus movimentos delicados nos trazendo de volta para os musculos, ossos e respiração. Pequenina e Intensa. Grande Mestra...
E fechamos assim a roda com mais um bailado de celebração.
Uma tarde, uma tarde...
UMA VIDA E MUITAS VIDAS!
O que permanece são os olhares, sorrisos, curiosidades, sons. O circulo nos faz iguais, espelhos e é muito bom se ver, sentir.
Os tambores ressoarão por muito tempo por aqui, e meu totem me seguirá. Assim como o Axé, o tonus no abdomen para manter a respiração e o tempo, a pesquisa e o estudo, e o retornar para a tribo.
Ir e ter aonde voltar.

bjs a todas e muita gratidão;

Patty

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O Lobo em 2012

O REI E O LOBO
Certo rei decidiu domesticar um lobo e transformá-lo em um cão dócil. Seu desejo baseava-se
 na ignorância e na ânsia de que os outros aprovassem e admirassem sua atitude, o que é causa
 freqüente de muitos problemas neste mundo. Fez com que tirassem de uma loba um dos seus
 filhotes recém-nascidos, e que fosse criado entre cães domésticos.
Quando o filhote de lobo cresceu, foi levado diante do rei e durante vários dias se comportou
exatamente como um cão.
As pessoas que viam esse fato assombroso ficavam maravilhadas e pensavam que o rei
 era extraordinário.
Agindo de acordo com essa crença, fizeram do rei seu conselheiro em todas as coisas e
 lhe atribuíam grandes poderes. O próprio rei acreditou que o que acontecera era quase um milagre.
 Um dia, quando estava caçando, o rei ouviu uma matilha de lobos que se aproximava.
 Quando os animais chegaram perto, o lobo doméstico deu um salto, mostrou as presas e correu
 para lhes dar as boas vindas.
Em poucos segundos desapareceu, de volta aos seus companheiros naturais.

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E veio o Lobo uivando para a lua, saudando a sua plenitude. Aquela luz imensa clareando a escuridão da floresta permitindo assim que ele atravessasse da densa mata subindo a montanha e alcançando o seu cume. Naquela imensidão azul, solitária e cheia de sabedoria ele começa a agradecer aos ancestrais, a todos os seres que vieram antes e que virão depois. É o momento do saber, é o presente. A caminhada foi longa e o uivo tem uma mistura de tristeza/alegria, uma despedida, sabendo que ao nascer do sol a realidade não será mais a mesma.
Assim chegamos ao final de 2011.

Entraremos em 2012 no ano 5, ano da Lua.
Sabedores da vida. Autônomos. Obtivemos experiencia e friccionamos o 1 e o 2 para trazermos o fogo do três, a terra do quatro e o homem sentido no 5.
Um ano do sentir (emoção) e do sentir (direção).
Aprendi bastante e agora o que faço com isso?
O Lobo quando adquire conhecimento volta a sua tribo para ensinar aos seus irmãos - por isso ele é conhecido como o Totem do Professor/Ensinamento. Neste instante é necessário ter discernimento para a mensagem que será transmitida. Que seja de paz, de crescimento, de harmonia. E não o inverso. Saber e ensinar é uma responsabilidade. E não passar o conhecimento também.
E é neste casamento Lobo/Lua que conseguimos saber a dose certa a ser empregada em cada circunstancia.

O nr.5 é conhecido também como a vibração do homem, da autonomia e independencia. É o homem na estrela de cinco pontas com ambos os pes na terra e a cabeça se elevando em direção aos céus. A estrela de cinco pontas é um simbolo do homem integrado à totalidade cosmica.
Se visualizarmos uma piramide temos quatro vertices que vão em direção ao cume...a terra que se eleva para o céu.
Sim, com esta autonomia e conhecimento equilibrados na emoção obtemos finalmente a quintessencia nos tornando modelos para aumentar a massa critica, entendendo cada vez mais o que nos cabe e o que se faz necessário em determinados momentos para um reajuste natural de uma nova forma de viver.
Cada um fazendo a sua parte, uivando a sua maneira sem esquecer de voltar a sua tribo para compartilhar percepções e experiencias.

...e assim vamos soltando a nossa parte selvagem integrando a parte domesticada e encontrando uma integração para que a essencia se manifeste mais verdadeira.

bjs;

Patty